DESCENDENTES DE IMIGRANTES CONSEGUEM DUPLA CIDADANIA

Não é necessário o comparecimento em juízo de todos os integrantes da família para que se proceda à retificação de erros gráficos nos registros civis dos ancestrais. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, em recente julgamento (Recurso Especial nº 1138103/PR), decidiu que não é necessário o comparecimento em juízo dos integrantes da família para que se proceda à retificação de erros gráficos nos registros civis.

Integrantes de uma família de origem italiana entraram com ação na justiça para retificar suas certidões de nascimento e casamento em decorrência de erro comum no registro do sobrenome, bem como corrigir os registros de seus ancestrais, inclusive certidões de óbito.

O Ministério Público havia opinado pelo indeferimento do pedido, por entender que a mudança causaria desagregação nas anotações registrais brasileiras. A sentença, reconhecendo erros gráficos nos primeiros registros civis dos ancestrais, concedeu a retificação, por considerar que a pretensão era legítima e razoável, entendimento mantido na segunda instância.

Em sua manifestação o MP argumentou que haveria necessidade da presença em Juízo de todos os integrantes da família para a retificação do sobrenome, uma vez que a decisão extrapola a esfera de interesse dos recorridos, alcançando demais herdeiros, sob pena de ruptura da cadeia familiar.

O Ministro Luis Felipe Salomão (relator) destacou que o nome civil está intimamente vinculado à identidade da pessoa, mas sua inalterabilidade é relativa. Segundo esse entendimento, o nome estabelecido por ocasião do nascimento possui “ares de definitividade”, sendo sua modificação admitida nas hipóteses determinadas em lei ou reconhecidas como excepcionais pela justiça.

Lembrando que a dupla cidadania é um direito constitucional em nosso país, nos casos de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira, o ministro disse que muitos nomes de imigrantes sofreram alterações por ocasião de sua chegada ao Brasil, especialmente em virtude do desconhecimento dos idiomas de origem por parte dos serventuários dos cartórios. Citando o artigo 57 da Lei de Registros Públicos, Salomão considerou que cabe ao juiz autorizar a retificação do sobrenome diante de motivo justo.

“Os recorridos pretendem encaminhar a documentação exigida para a obtenção da cidadania italiana, necessitando, para tanto, do suprimento de incorreções na grafia do patronímico, sem o que teriam obstadas a sua pretensão. Eis o justo motivo”, O Ministro destacou que a jurisprudência do STJ tem exigido como requisito para a realização do procedimento: a ausência de prejuízo a terceiros.

O prejuízo a terceiros poderia ocorrer, por exemplo, se o requerente estivesse respondendo a ações civis ou penais ou se tivesse seu nome incluído em serviço de proteção ao crédito, entretanto, no caso concreto, não há menção de restrições dessa natureza por parte do juiz ou do Tribunal.

O ministro reconheceu a desnecessidade da inclusão de todos os membros da família como coautores da ação, entendendo que não é o caso de litisconsórcio, por tratar-se de procedimento de jurisdição voluntária em que não há lide nem partes, mas somente interessados. Assim, seria incabível cogitar de litisconsórcio necessário, principalmente no polo ativo. Ao contrário do entendimento do MP, as retificações pretendidas poderão beneficiar outros parentes, uma vez que facilitam a obtenção da cidadania. Concluiu o Ministro que a retificação dos assentos com incorreção de grafia significa o resgate da realidade histórica do tronco familiar e sua adequação ao registro público.

(KELIN CHRISTINE DAPPER DEOSTI)